Tania Jamardo Faillace, jornalista e delegada RP1
Como já repetimos várias vezes, o PAC da Copa se apresenta como uma ocasião excepcional, fora-de-série, para empresas e amigos ganharem dinheiro. Não que a realização de uns dois jogos na cidade de Porto Alegre vá tornar nossa Capital um grande centro de turismo – o Forum Social Mundial fez isso muito melhor no início dos anos 2000.
A Copa representa poucos dias de atração, que não vão dar oportunidade para grandes passeios e excursões. Mas apresenta uma chance magnífica, de atrair grandes investimentos, prometer lucros fantásticos, sem que o próprio investidor tenha que arriscar grande coisa, à espera dos resultados, e, principalmente, vai ficar vários anos sem pagar impostos!
Para quem, como os empresários, tanto se queixa dos impostos – não se queixam dos salários pagos, porque nunca pagam tão pouco – isso é maravilhoso, e não dá para perder.
Por isso, aparecem os projetos mais exóticos e sem utilidade alguma para a cidade e sua população. O importante é fazer negócios.
Temos, na Região 5, o caso do Jockey Club. O Jockey Club já causou a expulsão de muitas famílias para se instalar onde está, sem ter precisado gastar dinheiro: recebeu todo aquele terrenão de graça por parte do Estado, quando seu hipódromo antigo foi demolido para dar lugar ao famoso Parcão do bairro Moinhos de Vento. Ganhou também uma área grande nas vizinhanças da Tronco para instalar suas cocheiras. Cocheiras que alojam além dos cavalos corredores, os cavalos de proprietários de Porto Alegre que não podem levá-los para seus apartamentos.
Com a queda do gosto popular pelas corridas de cavalos, o chamado esporte do turfe começou a ter problemas para sustentar-se. A idéia foi: por que não vender a área das cocheiras? Fica perto de tudo: no Cristal, a poucos metros do Beira Rio e das atividades e corredores da Copa do Mundo – uns bons edifícios ali podem passar por empreendimento da Copa e ganhar umas boas isenções fiscais.
Um problema: sendo uma área doada, não pode ser vendida, tal e qual a área do Humaitá, abordada nos capítulos 3 e 4. Mas nossa ex-governadora, como de costume, não se apertou: fez uma troca dos gravames, aqueles, de impenhorabilidade e inalienabilidade. Mas foi cautelosa: ao invés de passar os gravames ilegalmente para uma área de terceiros, como fez no caso da Arena, passou para o próprio hipódromo. O Jockey Club não poderia mais vender o hipódromo, que não pensava vender, de qualquer jeito, e em troca, teria liberada a área das cocheiras.
Esqueceu-se de um detalhe: o hipódromo foi tombado como patrimônio histórico e cultural da cidade. Não pode, pois, ser gravado, está acima desses negócios comuns.
Ainda não se sabe como o nó será desatado, já que a área das cocheiras era também usada como moradia de pessoas.
A outra obra, que não é bem uma obra, mas uma intenção, tem ligação com as propostas de arrendamento e privatização do cais Mauá: algumas torres mais ou menos da altura da Chaminé do Gasômetro, perto da mesma, para fazer conjunto, não tendo havido a preocupação de preservar a paisagem mais típica de nossa cidade: a usina, o cais e seus armazéns, as ilhas ao fundo.
O principal, porém, são os parques públicos Marinha do Brasil e Gasômetro, os mais populares de Porto Alegre, junto com o Farroupilha.
É esse “popular” que incomoda a nossa prefeitura. Não quer que Porto Alegre seja conhecida como uma cidade “popular”, e de grande movimentação política, quer que seja conhecida como uma cidade elegante e sofisticada, feita para o turismo de luxo, como Dubai, a ilha artificial dos Emirados Árabes, que é a inspiração do Grupo de Trabalho da Orla.
Um cinturão de edifícios de concreto ao longo da zona Sul, garantindo a exclusividade do espetáculo do pôr-do-sol para quem puder pagar por ele, e, antes disso, maquiar Marinha e Gasômetro, alterando o nível social de seus freqüentadores.
Um funcionário da Prefeitura chegou a dizer a um dos pequenos comerciantes das barracas do Gasômetro: “vocês vão ter que sair daí, vocês não têm cultura para receber visitantes estrangeiros!”
A idéia é fazer uma PPP, parceria público-privada, que vai alterar o meio físico: o GT da Orla acha que há árvores demais nos parques, é preciso ir cortando algumas para “não estragar a paisagem”; já está sendo aberta a avenida que vocês sabem, cortando o Marinha, e combinando com o futuro binário atropelador da Borges/Praia de Belas. Esse binário, no Menino Deus, vai-se juntar com a avenida Tronco, juntando assim várias obras do PAC da Copa.
Já perto do Dilúvio, na orla Centro, vão ser construídas palafitas rio a dentro! Palafitas!
Essas palafitas vão sustentar uma extensão da avenida Ipiranga dentro do rio, com diversos pontos de estacionamento para carros. Nessas vias sobre palafitas, que também formarão uma marina, os carros vão ser parte da paisagem e do pôr de sol do Guaíba.
O turista não precisará mais suportar uma paisagem natural, comum, com árvores, famílias, crianças, piqueniques, cachorros: bastante concreto, mirantes de concreto, pistas de asfalto e carros dentro do rio para olhar essas belezas.
Com relação ao passeio da praia, também será alterado. Quadras oficiais de esporte ocuparão toda a faixa, acabando as sonecas em esteiras ou redes, e os jogos sem regras com os filhos pequenos. Isto é, a idéia é acabar com a informalidade e descontração pacífica e familiar, característica de nossos parques urbanos populares.
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