segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Remoção da Vila Dique esbarra em atraso de obras


Custos maiores para erguer moradias levaram a desfecho e novo adiamento da obra que busca abrigar 900 famílias


Patrícia Comunello


Valores subestimados para custear a conclusão de quase 1,5 mil moradias destinadas à remoção das pessoas que habitam a popular Vila Dique, área de invasão nas proximidades do Aeroporto Internacional Salgado Filho, obrigaram a prefeitura de Porto Alegre a buscar novos construtores.

Com isso, a saída de quase 900 famílias tem prazo incerto e deve ultrapassar 2012. O cronograma original dava conta da conclusão de todo o loteamento na metade de 2010. Pelo acordo firmado na semana passada com o Departamento Municipal de Habitação (Demhab), a construtora Dan-Herbert, com sede em Brasília, comprometeu-se a finalizar mais 400 unidades, que já estão em produção na área do Loteamento Bernardino Silveira Amorim, no Porto Seco, além das 484 já entregues. Faltarão quase 500 para zerar o projeto.

A finalização do loteamento é essencial para permitir as obras de duplicação e ampliação da avenida Severo Dullius, incluída no pacote para a Copa do Mundo de 2014. Os invasores estão assentados exatamente no trecho final do atual traçado da Severo Dullius, extensão que já existe da via. O diretor-geral do Demhab, Humberto Goulart, adianta que já solicitou ao Ministério das Cidades a inclusão do estoque que falta no programa Minha Casa Minha Vida. A intenção seria executar a obra dentro da faixa de até três salários-mínimos, com forte subsídio para os futuros moradores.

Uma dificuldade que pode atrapalhar os planos, contabiliza o próprio Goulart, é o fato de que a atual licitação fazia parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) 1, com verbas de R$ 33,5 milhões. Caso a tentativa junto à pasta das Cidades seja frustrada, o diretor-geral do departamento municipal já tem na manga a abertura de concorrência para atrair interessados na empreitada.

“Desta vez, vamos chamar as duas primeiras colocadas da disputa para evitar que haja algum problema na execução”, adianta o gestor.

A trajetória do contrato com a construtora brasiliense não surpreende segmentos do setor na Capital e nem mesmo o comando do Demhab. Goulart alega ter herdado o impasse da execução. O atual diretor-geral, que está na pasta desde 2010, indica que a Dan-Herbert acabou entrando na disputa, que teve de ser lançado por duas vezes por falta de interessados, pois achava que haveria mais aditivos para ampliar o orçamento. O valor do PAC previa R$ 33,5 milhões para as 1.476 unidades. “Eles fizeram um mau negócio, mas achavam que haveria realinhamento de preços”, comenta Goulart. “A prefeitura não é culpada se a empresa não cumpriu o contrato”. Os recursos, a partir da fiscalização feita pelos técnicos do Demhab e da Caixa Econômica Federal, só eram liberados à medida que as casas eram terminadas.

A reportagem tentou contato com a direção da empresa, que não retornou às ligações. Mesmo durante o contrato, houve aditivos, que incluíram novas obras, mas não ampliaram o valor orçado para as moradias. A empresa chegou a sofrer multas por não cumprir prazos e o volume de casas.

O diretor-geral do departamento estima que seriam necessários R$ 9 milhões para concluir as unidades que faltam. A expectativa é custear o valor com a nova licitação. Na supressão do contrato, os técnicos do Demhab fizeram cálculos para confrontar o que foi feito, o que poderá ainda ser realizado e o que não será concluído. 

Falta de mão de obra atrasa o cronograma

O resultado da novela do loteamento é o cenário atual, com parte da área da região tomada por mato, ao lado de moradias ainda sendo erguidas. No canteiro de obras, funcionários da Dan-Herbert evitam comentar o andamento dos trabalhos. “Só quem fala é o Demhab”, desconversa um deles. Trabalhadores queixam-se que o ritmo é menor pois falta mão de obra.

O desempregado Gilberto Comin, líder de uma das quadras, cobra as creches, escolas e posto de saúde para a população. “Tínhamos tudo na Dique. Agora é preciso percorrer longas distâncias”, protesta o morador. A assessoria do departamento de habitação informou que os serviços são de responsabilidade de outras secretarias. Com o atraso das obras, unidades destinadas a portadores de necessidades especiais que estão na área ainda com prédios a serem concluídos não podem ser liberadas para ocupação. Pelo acordo, até o final deste ano, a empresa deverá entregar cerca de 400 casas que já estão sendo erguidas. O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon-RS), Paulo Garcia, considera os parâmetros para execução fora da realidade. “Pelos valores orçados, cada moradia sairia por R$ 23 mil. Teria de ser por mais de R$ 55 mil”, confronta o dirigente. 


O projeto na Vila Dique

O que: 

construção de 1.476 unidades para moradores da Vila Dique

Contratação: 

o Dehmab lançou dois editais em 2008 para selecionar uma construtora. No primeiro, não houve inscritos. No segundo, concluído em outubro do mesmo ano, concorreram a Arcol Indústria Ltda e a Dan Herbert S/A Consultoria e Incorporadora, de Brasília. Para tornar a licitação atrativa, o órgão fez um aditivo, elevando os recursos em R$ 5,2 milhões (recursos do município). Com a alteração, o total de verbas para infraestrutura e as moradias ficou em R$ 56,5 milhões (R$ 33,5 milhões da União, 59,28%, e R$ 23,02 milhões da prefeitura, ou 40,72%).

O que foi feito: 

484 unidades foram entregues em 2,5 anos. Acordo firmado em 10 de agosto entre o Demhab e a Dan-Herbert suprimiu a meta total de moradias e acertou a conclusão de mais 400 casas, que estão em andamento. O restante, cerca de 500, será erguido a partir de nova licitação a ser feita pelo órgão. 


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