No último sábado, 30 de julho, os comitês populares dos megaeventos realizaram manifestações em São Paulo e no Rio de Janeiro, na mesma data do sorteio das eliminatórias da Copa do Mundo de 2014. Com a discussão que envolve o Brasil como sede da Copa e das Olimpíadas de 2016, os comitês têm se mobilizado para monitorar os impactos dos megaeventos e denunciar violações aos direitos humanos nas cidades brasileiras.
São Paulo possui seu comitê popular desde maio e está articulando diversas atividades, como a realizada no último dia 30 na área de construção do estádio do Corinthians, em Itaquera, Zona Leste de São Paulo. Na ocasião, entidades e movimento promoveram um ato contra o uso de verbas públicas em obras para a Copa e as remoções que essas obras devem causar. Já Manaus fundou seu comitê em julho, assim como Recife, e participou nesta segunda-feira (01/08) de uma audiência pública sobre a realização da Copa na cidade. Enquanto isso, jovens de Porto Alegre, motivados pelos protestos em São Paulo e no Rio, estão organizando um ato nessa sexta-feira, 5 de agosto, contra o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira.
Fortaleza também preparou ato contra as irregularidades da Copa na mesma semana do sorteio das chaves de disputa. Ercília Maia, moradora da comunidade Aldacir Barbosa e militante do Movimento dos Conselhos Populares, comenta que o Comitê Popular de Fortaleza começou a se articular após um curso promovido pela ONG CEARAH Periferia, em 2009. Com o início das obras na cidade, o movimento se intensificou.
O comitê popular e os moradores da Trilha do Senhor realizaram exposição em julho denominada “Daqui não saio”, registrando diversos momentos da comunidade, afetada diretamente pela ampliação da Via Expressa. Nesse mesmo mês ocorreu a audiência pública para o licenciamento ambiental do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), que vai desalojar mais de cinco mil famílias em 20 bairros da cidade, segundo Ercília. Ela ressalta a importância da participação das comunidades nos debates sobre o assunto.
Em Cuiabá, o comitê ainda está em fase de formação, mas organizações e redes locais já estão se reunindo com moradores em risco de despejo e com o Ministério Público e Defensoria. Já no Rio de Janeiro, a Rede de Megaeventos (Reme) deu continuidade ao Comitê Social do Pan e, no início desse ano, transformou-se em Comitê Popular da Copa e Olimpíadas do Rio. Com a mudança do nome, pretende-se intensificar a luta nacional e agregar mais organizações. No dia 25 de março, data comemorativa de um ano do Fórum Social Urbano, o comitê do Rio fez a primeira grande atividade. Foi produzido um jornal e lançado o blog do comitê, que já realizou duas audiências públicas com o Ministério Público Federal.
Rossana Tavares, da FASE Rio, conta que a situação da cidade ainda tem a especificidade das Olimpíadas de 2016. Ela afirma que lideranças de comunidades atuantes mais na esfera local estão se inserindo no comitê, que hoje cresce para além dos movimentos ligados ao direito à moradia, com a presença, por exemplo, de professores e organizações ligadas aos torcedores. “Um desafio é agregar toda a diversidade”. Isto se dá pela centralidade da atuação na questão dos despejos. Outros comitês também estão em fase de articulação e proposição de atividades em Curitiba, Belo Horizonte, Salvador, Natal e Brasília.
Comitês Populares
Os comitês reúnem movimentos populares, entidades, ONGs, associações de moradores, pesquisadores e outros segmentos interessados em acompanhar de perto o que está programado para os megaeventos, no sentido de exigir respeito aos direitos dos moradores. O primeiro a se formar foi o comitê popular do Rio de Janeiro, ainda no período dos Jogos Panamericanos, em 2007, evento que também motivou remoções forçadas de comunidades, sem diálogo ou participação popular nas decisões. Durante o ano de 2010, outros dois comitês se formaram: o de Porto Alegre e o de Fortaleza.
Rosilene Wansetto, membro da coordenação da rede Jubileu Sul, conta que em novembro de 2010 articulou-se o primeiro seminário nacional para debater o assunto. Estavam presentes representantes de dez cidades, reunindo mais de 50 pessoas. A partir desse encontro, estabeleceu-se a meta de formar comitês populares em todas as doze cidades que serão sede dos jogos da Copa de 2014, já que a maioria delas ainda não tinha um. Em março houve a plenária nacional e um próximo encontro está marcado para agosto.
Atualmente, a articulação nacional possui uma representação de cada comitê e pretende estabelecer ações nacionais comuns e estratégias de comunicar suas lutas e denúncias, além de definir linhas políticas e ser um apoio para os comitês locais. Dessa forma, a articulação divulgou documento em que aponta urgências na questão dos megaeventos, exigindo a realização de consultas públicas para participação popular, transparência e acesso às informações, respeito aos direitos trabalhistas, proibição dos despejos e remoções forçadas e não violação dos direitos humanos. Também ressalta o repúdio à “cidade de exceção”, criada pelos megaeventos, em que é comum a concessão tácita para a realização de obras abusivas.
Rosilene comenta o caráter popular dos comitês, que são formados por organizações que já fazem historicamente um trabalho com os movimentos de moradia, com as mulheres, e com a população de rua. Ela ainda ressalta a especificidade do espaço: “cada comitê tem uma característica, um jeito de trabalhar, a partir das realidades locais”. Os comitês pensam nas suas atividades a partir das obras que vão ocorrendo nas cidades. Ela fala também da parceria próxima com o Ministério Público, que tem denunciado irregularidades nas construções para os megaeventos.
Impactos dos megaeventos
A maioria das cidades possui obras de implementação de corredores de ônibus e vias de acesso, além de reformas ou construção de estádios. Belo Horizonte, por exemplo, apresenta um histórico de remoção anterior às obras da Copa, mas a reforma do estádio Mineirão, onde serão realizados os jogos na cidade, também está relacionada aos despejos. Segundo o dossiêdivulgado pela Relatoria do Direito à Moradia em março desse ano, as obras de conexão viária com o estádio são as que mais estão causando impactos. O comunicado ressalta ainda que a construção de cerca de 70 mil unidades habitacionais pelo setor privado, das quais 4 mil serão utilizadas pelo setor hoteleiro durante o evento, afetará uma comunidade remanescente de quilombolas.
Já em Curitiba, as obras também estão relacionadas à construção ou ampliação de corredores de ônibus, à adequação de vias e à reforma da Arena da Baixada. No caso de Natal, o dossiê da Relatoria apresenta como maior conflito a construção do novo aeroporto internacional, no município de São Gonçalo do Amarante, que afetará 345 famílias da comunidade Padre João Maria.
No Rio de Janeiro, as obras dos megaeventos incluem a construção de corredores de ônibus, a expansão de uma linha de metrô, a reforma do aeroporto Tom Jobim e a construção de instalações esportivas. A comunidade Vila Autódromo, por exemplo, tem sido área de remoções desde os Jogos Pan Americanos e continua sofrendo com o projeto olímpico.
Conheça mais sobre os comitês populares
Belo Horizonte
Confira também a Rede Megaeventos.
Acesse aqui o Especial ABONG - Impactos socioambientais da Copa e das Olimpíadas no Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário