sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Despejo forçado em Itabira: terrorismo do Estado

As bananeiras, as mangueiras, as hortas, os jardins, as casas, os sonhos... Tudo foi arrancado para ceder lugar a um bairro nobre
05/08/2011
Gilvander Luís Moreira Nos dias 1º e 2 de agosto de 2011, em Itabira, MG, Brasil, no bairro Drummond, 300 famílias sem teto que ocupavam, há 11 anos, uma área abandonada, que não cumpria a função social, foram vítimas de um despejo forçado. A família Rosa, que ganhou na (in)justiça a reintegração de posse, deve à prefeitura de Itabira mais de 1 milhão de reais, em IPTU, dívida não executada por nenhum prefeito de Itabira nos últimos 47 anos.
Dezenas de policiais de Minas Gerais ocuparam a comunidade Drummond, por vários dias, fortemente armados, antes do dia marcado para o despejo (1º de agosto) e pressionaram as 300 famílias a sair. “Se vocês não saírem antes do dia 1º de agosto, sairão sob a mira das armas”, era o recado.O Governo de Minas (PSDB + DEM), o Tribunal de Justiça e o juiz da 1ª Vara Cível de Itabira, André Luiz Pimenta, e a família Rosa não apresentaram uma alternativa de moradia digna para as 296 famílias com renda de 0 a 3 salários – segundo cadastro da prefeitura.Dia 2 de agosto, último dia do despejo forçado, centenas de policiais, fortemente armados, com dezenas de soldados da cavalaria, com dois helicópteros e vários tratores, foi consumada uma verdadeira sexta-feira da paixão em Itabira: o despejo forçado de 300 famílias sem teto.O prefeito de Itabira, Sr. João Izael (do PR), montou um “Campo de refugiados” – “campo de concentração de guerra” -, do outro lado da cidade e chamou de “abrigo” cubículos de madeirite, de 3 X 4 metros, um estábulo que não serve nem para animais irracionais. Muitas famílias ao serem jogadas nos cubículos, chorando, clamaram: “Não somos cachorros para viver num caixote desses, não.” Pouquíssimos banheiros para 50 famílias...

Dezenas de caminhões e caçambas, escoltados pela polícia, levaram os pertences das 300 famílias de Drummond. Para onde? Não se sabe ao certo. Nos cubículos do “abrigo” não dá para as pessoas dormirem, quanto mais para colocar os móveis e objetos das famílias.O déficit habitacional em Minas Gerais está acima de 1 milhão de moradias. O (des)governo de Minas (PSDB + DEM), em 12 anos, construiu apenas 28 mil moradias no estado, nenhuma na capital. Mesmo diante deste cenário, em Itabira, um massacre branco ocorreu: 300 casas de alvenaria, construídas com muito suor e trabalho árduo, foram destruídas com vários tratores e 300 famílias jogadas nas agruras da “rua”. Indenizarão as famílias pelos prejuízos sofridos? Óbvio que não. O povo deve ter investido na construção das 300 casas de alvenaria mais de R$ 4 milhões. Puderam levar só algumas portas e janelas. Isso enquanto há 9,8 milhões de pessoas sem casa no Brasil. É a opressão da classe dominante sobre a classe empobrecida. É o “projeto de políticas públicas” que um Estado capitalista, com “políticos profissionais”, tem para os pobres. Diante deste quadro, como calar? Como obedecer? Como não ouvir o grito de dor, o clamor...?Numa postura de Pilatos, oficiais de justiça, policiais, funcionários da prefeitura de Itabira, o juiz, desembargadores e .... alegavam: “estamos cumprindo ordens.” A esses recordo: ninguém está obrigado a cumprir leis e ordens injustas. A lei maior do Deus da vida diz: não matarás! nem sob o fogo das armas e nem a conta-gota. A Carta magna do Estado brasileiro, logo no primeiro artigo, assegura como princípio fundamental a dignidade da pessoa humana. Todas as demais leis, ordens, ações públicas ou privadas só devem ser respeitadas e cumpridas se respeitaram este princípio, caso contrário, trata-se de leis e ações imorais e inconstitucionais.O Ministério Público Federal encaminhou parecer ao Governador Anastasia, dizendo: “Preocupa-nos o fato de que os despejos forçados, por si só, possuam efeitos profundos e duradouros na vida das famílias atingidas, sendo incompatíveis com o cumprimento de diversos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, afirmados em nossa Constituição Federal de 1988 e na legislação interna em matéria de proteção à dignidade da pessoa humana e do direito humano à moradia.”Nunca vi tanta desolação, tanta dor e tanta lágrima! Crianças, mulheres, homens, doentes e idosos com voz trêmula desabafavam: “Isso é um terror! Estão nos apunhalando. Querem nos matar aos poucos.” Várias pessoas foram hospitalizadas. Mulheres grávidas que, sob o choque do despejo, estão com a gravidez em risco.As bananeiras, as mangueiras, as hortas, os jardins, as casas, os sonhos... Tudo foi arrancado para ceder lugar a um bairro nobre – condomínio de luxo – que a família Rosa fará na área. Com essa ação injusta e covarde, esse território ficou amaldiçoado.Para as 300 famílias que, com hortas, bananal e muita criatividade, conquistavam sua alimentação, agora, despejadas, resta a fome, a humilhação, o descaso, a dor... e se levantar e continuar lutando.

Centenas de crianças foram jogadas em cubículos de madeirite, de 3 X 4 metros, sob um calor federal. Cadê o respeito à dignidade humana? É assim que se cria “marginais”: marginaliza-se para depois dizer em alto e bom som, em todos os meios de comunicação: “são marginais”. Mas quem os marginalizou? Aliás, por que a Imprensa de Minas não esteve no local para noticiar o que aconteceu? Está “censurada” pelo capital. Os direitos de centenas de crianças, assegurados no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), foram pisados. Jogadas em um Campo de Refugiados, do outro lado da cidade de Itabira, não poderão continuar na escola. Triste de um país que humilha suas crianças! Por que o juiz e o TJMG não puderam esperar construir moradias dignas para as famílias?Mas, despejo forçado, injustiça, opressão e humilhação não são, não podem ser, não serão as últimas palavras! O povo seguirá lutando em Itabira, em Minas Gerais, em todo canto do Brasil e do mundo. As últimas palavras hão de ser Liberdade, Justiça social, dignidade humana e planetária. Mesmo com lágrimas, nossos braços se erguerão e do nosso peito sempre um forte grito, rasgando o céu e o chão, ecoará: PÁTRIA LIVRE! VENCEREMOS! Um domingo de ressurreição brotará da luta dos justos e dos pobres. Gilvander Luís Moreira é Frei e padre carmelita; mestre em Exegese Bíblica; professor do Evangelho de Lucas e Atos dos Apóstolos, no Instituto Santo Tomás de Aquino – ISTA -, em Belo Horizonte – e no Seminário da Arquidiocese de Mariana, MG; assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina
 Fotos cedidas por Gilvander Luís Moreira

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